11/04/2025

Silveira fala em ampliar isenção da conta de luz, e Haddad nega que Fazenda estude proposta

Por: Nicola Pamplona e Idiana Tomazelli
Fonte: Folha de S. Paulo
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou nesta quinta-feira
(10) que a proposta de reforma do setor elétrico em estudo pelo governo prevê
ampliar a isenção do pagamento da conta de luz para até 60 milhões de
brasileiros.
A tarifa social atualmente beneficia cerca de 40 milhões de pessoas com
desconto de até 65% —há isenção apenas para indígenas e quilombolas. A nova
proposta, diz Silveira, é isentar do pagamento todas as unidades com consumo
de até 80 kilowatts-hora (kWh) por mês.
A proposta deve ser enviada à Casa Civil até o fim deste mês, mas já é alvo de
embates com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que discorda do uso
de recursos do Fundo Social do petróleo para bancar subsídios ao setor.
Após a declaração de Silveira, Haddad negou que a proposta esteja em estudo
na Fazenda ou na Casa Civil. "Não tem nenhum estudo na Fazenda, nem na
Casa Civil, sobre esse tema. Não chegou ao conhecimento nem do Palácio [do
Planalto]", disse.
"Eu liguei para o Rui [Costa, chefe da Casa Civil] para saber se tinha alguma
coisa. O Rui me confirmou que não está tramitando nenhum projeto nesse
sentido", completou o ministro.
Haddad disse que não há nada que impeça a Fazenda de "estudar o que quer
que seja", mas ressaltou que, neste momento, "não há nada tramitando".
Questionado sobre a possibilidade de avaliar o projeto diante de seu potencial
custo fiscal, o ministro afirmou desconhecer o teor da proposta.
A ampliação da isenção para famílias que consomem até 80 kWh por mês foi
defendida por Silveira em discurso no Fórum de Líderes em Energia, no Rio de
Janeiro. "Isso representa o consumo de uma família que tem uma geladeira, um
chuveiro elétrico, ferro de passar, carregador de celular, televisão e lâmpadas
para seis cômodos", afirmou o ministro de Minas e Energia.
"Há muita injustiça nas tarifas de energia elétrica", acrescentou. "Hoje, o
consumidor comum, que paga suas contas com dificuldade, financia o sustento
de poucos altamente organizados."
O ministério diz que a proposta permitirá a abertura do setor elétrico sem jogar
a conta sobre os consumidores mais pobres. "Chega dessa lei de Robin Hood
às avessas, que tira do pobre para dar ao rico", afirmou Silveira.
Outro plano da proposta de reforma do setor é garantir a consumidores
inscritos no CadÚnico com renda de até um salário mínimo a isenção da CDE
(Conta de Desenvolvimento Energético), encargo cobrado na conta de luz para
bancar subsídios setoriais —incluindo a tarifa social.
O ministério defende que o custo dos benefícios seja compensado com a
retirada de alguns gastos da CDE, que vai custar R$ 40 bilhões aos
consumidores de energia em 2025, segundo projeção da Aneel (Agência
Nacional de Energia Elétrica).
Silveira tem defendido que o Fundo Social do pré-sal banque a parcela desses
subsídios não relacionada ao setor elétrico. O fundo hoje serve basicamente
para compor o superávit primário do governo, mas recentemente teve seus usos
alterados por medida provisória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O Ministério da Fazenda, por sua vez, resiste a essa medida, que teria impacto
fiscal. O episódio é mais uma divergência entre as agendas dos dois ministros.
Como mostrou a Folha, há a avaliação majoritária entre auxiliares do presidente
e pessoas que circulam nos ambientes dos Poderes em Brasília de que, há algum
tempo, os dois não têm boa relação.
Sem o apoio da Fazenda, porém, Silveira diz que a retirada de benefícios a
setores hoje incentivados, como autoprodução de energias renováveis, e a
melhor distribuição dos custos de segurança do sistema poderiam compensar o
aumento da tarifa social.
"Necessitamos racionalizar os custos do setor e endereçar as injustiças na
composição da tarifa", afirmou. O ministério espera que, após análise da Casa
Civil, o projeto de lei chegue ao Congresso ainda no primeiro semestre.
O objetivo final, diz o ministério, é garantir as condições para a abertura
completa do setor elétrico, permitindo a todos os consumidores que busquem
o fornecedor que quiserem, como ocorre no mercado de telefonia, por
exemplo.
A reforma do setor elétrico vem sendo defendida por autoridades e executivos
do setor elétrico nos últimos anos, diante do crescente impacto dos subsídios
sobre a conta de luz e da consolidação das energias renováveis.
"A última grande reforma do setor elétrico brasileiro ocorreu no primeiro
governo do presidente Lula", disse no evento o diretor-geral da Aneel, Sandoval
Feitosa. "O modelo precisa ser adaptado às novas realidades, às novas
tecnologias".
Feitosa disse apoiar os termos propostos por Silveira, defendendo um combo
entre recursos do Tesouro e corte de outros subsídios para financiar o maior
acesso à tarifa social.
"A gente precisa enfrentar a modernização do setor elétrico. O setor público
não pode ser entrave ao desenvolvimento do setor", reforçou o presidente da
comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, Diego Andrade (PSDMG).